31 julho 2013

A CAUSA DAS COISAS

Aceita-se que terá sido por causa da importância do voto judaico que os conselheiros políticos do presidente Harry Truman lhe recomendaram apoiar a constituição do Estado de Israel em Maio de 1948 (acima), seis meses antes das eleições presidenciais que viriam a realizar-se nesse ano. Segundo eles, o voto dos judeus não era quantitativamente muito importante, rondaria apenas 2% do eleitorado total, mas ele tornava-se decisivo para ganhar o disputado estado de Nova Iorque¹ e os seus quase indispensáveis 47 eleitores do Colégio Eleitoral de 531 membros: desde 1876, apenas por uma vez um candidato (Wilson em 1916) fora eleito sem vencer em Nova Iorque. Truman terá percebido a essência do problema e a política externa norte-americana sofreu com isso uma inflexão pró-sionista. Terá compensado: Truman veio a ganhar, algo inesperadamente, as eleições presidenciais em Novembro desse ano mas ironicamente fê-lo sem vencer no estado de Nova Iorque e sem que chegasse a conquistar (e a precisar d)os cobiçados 47 eleitores nova-iorquinos.
 
¹ Nova Iorque é o estado norte-americano onde há maior concentração de judeus: são 9% da população total do estado.

AINDA AS GARGALHADAS ENLATADAS


Ainda a propósito da manipulação informativa aqui explicada por um poste anterior a respeito de como nos induzem os comportamentos, deixem-me apresentar dois exemplos simples desta manhã noticiosa, um de política, outro de economia:
Ontem à noite, Rui Rio deu uma entrevista à RTP, demarcando-se do PSD oficial, de onde os órgãos de comunicação social, a quente, destacaram tanto as suas críticas a Maria Luís Albuquerque como os seus comentários arrasadores sobre Luís Filipe Menezes: Rui Rio defende saída de Maria Luís Albuquerque e arrasa Menezes. Mas os títulos das notícias que apareceram publicadas esta manhã, mais reflectidos, já só dão destaque a Menezes, esquecendo a ministra das Finanças: Rio diz que seria hipócrita se apoiasse Menezes ou então Rui Rio diz que não vota em Menezes porque ele vai destruir tudo. No meio de um incómodo inevitável para o PSD e para o governo, não parece tratar-se de uma forma habilidosa de confinar as críticas de Rui Rio a um âmbito regional?

Noutro caso, a Jerónimo Martins anunciou hoje os seus resultados no primeiro semestre num daqueles artigos típicos do género, onde quase só se realçam os aspectos positivos das contas de exploração: Lucro da Jerónimo Martins sobe 9% no primeiro semestre. Contudo, simultaneamente, as acções da Jerónimo Martins destacam-se por ser das que mais baixaram na Bolsa de Lisboa no mesmo dia dessa publicação, afectando significativamente o índice bolsista: Jerónimo Martins afunda 5% e leva Lisboa à maior queda da Europa. Perante a incongruência de acções cujo valor baixa quando os lucros sobem, não será de questionar se não haverá por aqui sombra de inside trading e os mercados não disporão de informações suplementares para além daquelas que foram publicadas?...

NÃO UMA MANDATÁRIA MAS UMA PROVEDORA NA ANTECIPAÇÃO DE UMA FUTURA BASTONÁRIA

Percebe-se que um blogue envelheceu  quando se descobre que aquilo que se escreveu no passado se pode assemelhar a profecia. Há seis anos parodiava eu aqui a propensão de António Costa para montar operações de simpatia de uma correcção política tão açucarada que enjoa. E a paródia consistia, a pretexto da profusão de mandatários com que a sua candidatura contava (alguns deles, veneráveis como Raul Solnado e Saldanha Sanches, entretanto falecidos), em apontar ironicamente para a sua falta de atenção aos animais nossos amigos e para a paridade entre os sexos, duas flagrantes insuficiências na correcção política da sua campanha de então. Ora Deus não dorme e eu tenho de dar a mão à palmatória pois só agora descobri, mesmo não tendo havido mandatários para os bicharocos, que a Câmara Municipal de Lisboa a que António Costa superiormente preside nomeou recentemente uma provedora dos animais da cidade, cuja cerimónia de posse podemos abaixo seguir:

Faço meus os votos de sucessos endereçados pelo Malomil à Dra. Marta Rebelo, na constatação que nunca se perde tempo por esperar que um disparate se concretize.

30 julho 2013

RISO «ENLATADO»


Não será preciso perceber inglês para valer a pena ouvir e comparar estes dois vídeos de uma mesma cena de uma daquelas tradicionais comédias sitcom norte-americanas. O vídeo abaixo foi purgado da trilha sonora de gargalhadas que o de cima contém (conhecidas por riso enlatado) e a cena modifica-se significativamente, com o ritmo dos diálogos, agora intercalado de silêncios injustificáveis, a tornar-se pelo menos bizarro. É apenas uma daquelas curiosidades do mundo do espectáculo que vale sempre a pena apreciar mas também é uma chamada de atenção para que, como ali acontece, muitas outras situações que nos aparecem não são reais, antes montadas propositadamente para condicionar a disposição do auditório: nós. No recente caso dos torpedos, por exemplo, que oporá Álvaro Santos Pereira a Paulo Portas, alguém se incomodou a dar-nos uma panorâmica do número e do teor dos últimos despachos do primeiro enquanto ministro da Economia cessante?

DE LEÃO AO PEITO

Mesmo aceitando que a avaliação do sucesso do Plano de Resgate possa ser um daqueles segredos acessíveis apenas aos especialistas, as opiniões avulsas sobre o mesmo acabam por se poder estender legitimamente aos leigos, que não apenas a políticos, com a constatação que os chefes da missão do FMI em Portugal têm rodado nos últimos dois anos com uma frequência a lembrar as dos treinadores do Sporting...

29 julho 2013

O ISLÃO A VERDES MATIZADOS

Quando se descreve a geoestratégico-poética imagem da cintura islâmica ocupando uma posição estrategicamente central no Mundo está-se a reconhecer uma evidência geográfica enquanto se tenta simplificar várias outras evidências para benefício do impacto da descrição. É verdade que o Islão é uma única civilização e todas as sociedades muçulmanas, para além do estrito campo confessional, se baseiam em concepções e estruturas semelhantes ou similares em matéria de organização da família, da comunidade ou do Estado. Mas, pelo sucesso da sua própria expansão, há mais de um milénio que essas características comuns nunca se conseguiram traduzir numa capacidade concreta de constituir uma força política coerente para todo o Islão pela impossibilidade material de manter toda a comunidade (Umma) sob a autoridade de um mesmo poder político. Os ressurgimentos religiosos, como o do xiismo iraniano que tanto impressionaram o resto do Mundo há trinta anos, que se pretendem tradicionalmente refundacionais revelam-se afinal, quando enquadrados historicamente, fenómenos repetidos, localizados e tendentes a esgotarem-se ao fim de umas décadas.

Embora não aparecendo no mapa acima, até nós tivemos os nossos cá por Portugal com a vinda de Marrocos dos almorávidas no Século XI e dos almóadas no Século XII. Mas muitos outros movimentos de regeneração religiosa que apareceram ao longo dos quase catorze séculos que a História do Islão desapareceram politicamente mas perduraram ideologicamente para dar ao mapa a aparência matizada que acima se pode apreciar, com identidades próprias para o Irão e Iraque, para a Arábia Saudita, para o Iémen, para Omã, para toda a África Ocidental, mas também para a África Oriental ou ainda para toda a Malásia e Indonésia. De uma forma analítica, Samuel P. Huntington reconheceu implicitamente essa dificuldade para que o Islão adoptasse alguma coerência política quando reconheceu, no seu famoso livro Choque de Civilizações, que nesta, ao contrário de outras, não existia uma potência que nela pudesse vir a assumir nitidamente a hegemonia. Apresentado de uma forma mais prosaica, explique-se que o Paquistão bem pode, para efeitos de retórica, baptizar o seu arsenal nuclear de islâmico, mas não será isso que dissuade o seu vizinho Irão de trabalhar para vir a ter o seu, possivelmente por, para si, ser mais islâmico ainda

28 julho 2013

POR OCASIÃO DO 43º ANIVERSÁRIO DA MORTE DE SALAZAR


Há 43 anos, o que mais me aborreceu na morte de Salazar foi, especialmente por estar em férias, a alteração radical imposta à programação televisiva: foi quase uma semana completa de programas soturnos encadeados, dedicados todos a elogiar a obra do defunto, até à saturação. No vídeo acima, em que se revive muito bem através do som a chatice da atmosfera de pesar de todos aqueles dias, a minha solidariedade ainda que tardia vai para as meninas da Mocidade, especialmente as mais escuras, mandadas para ali corroborar que Portugal ainda pretendia vir a ser uma nação multirracial e pluricontinental.

A CHEGADA A LONDRES DA MARCHA DE JARROW

Jarrow é uma cidade do norte de Inglaterra a cerca de dez quilómetros de Newcastle. Os problemas da cidade com o desemprego datam da Grande Depressão na década de 1930 e, não por acaso, desde essa época, há quase oitenta anos, que os deputados eleitos por aquele círculo eleitoral têm sido continuamente do Partido Trabalhista. Em 1936, a deputada local Ellen Wilkinson, também conhecida por Ellen-a-Vermelha, tanto por causa das suas convicções radicais como pela cor do seu cabelo, promoveu uma marcha em direcção a Londres para chamar a atenção para o gravíssimo problema do desemprego em Jarrow que então se cifrava em valores próximos dos 70%! Os cerca de 200 marchadores demoraram quase um mês a percorrer os quase 500 km que separavam Jarrow de Londres, onde chegaram na noite de 31 de Outubro, momento pintado acima. Política e economicamente a marcha não foi nenhum sucesso: o primeiro-ministro conservador Stanley Baldwin recusou-se a receber uma delegação sua, alegadamente para não estabelecer precedentes; a petição de 11.000 assinaturas que os acompanhava foi acolhida na Câmara dos Comuns com palavras de simpatia mas sem quaisquer medidas concretas quanto à reanimação da indústria da construção naval de Jarrow.
O que torna o quadro do início interessante não é evidentemente a mestria do autor, antes a rivalidade que o separava da promotora da marcha. Thomas Dugdale que o pintou era não apenas um esteta dândi que exibia ostensivamente um lenço colorido no bolso do colete para se distinguir dos tons desmaiados em voga à época, mas também um político conservador, membro do parlamento por Richmond, um círculo eleitoral vizinho e rival do de Jastrow no norte de Inglaterra que, em vez de se tornar vermelho, virara azul com um historial - actual - de mais de um século elegendo consecutivos deputados conservadores. A pintura realça o contraste entre dois mundos, um deles representado pelos dois jovens, ele indolente e alheio, ela lânguida mas curiosa, que fumam os seus cigarros por boquilhas, enquanto o fogo do mundo exterior é representado pelos clarões das tochas dos marchantes que aparece diluído numa espécie de borrão anónimo onde não se esquecem as silhuetas tranquilizadoras da fila de polícias a cavalo que a acompanham. A indiferença posada, nesta pintura praticamente desconhecida tão bem protagonizada pelo jovem que se entretém a fazer argolas de fumo, ocorreu-me a propósito do perfil dos participantes na recente cerimónia da tomada de posse e reposse dos dezanove secretários de estado (foto acima).
Sabe-se o quanto à esquerda se tem a irritante mania de deter o monopólio das preocupações sociais, o que historicamente até nem sempre é suportado pela verdade, mas também tem sido verdade que a imagem promovida pelo actual governo nos últimos dois anos e o seu constante alheamento ao impacto e aos efeitos colaterais da acção governativa, tão bem sintetizada naquela fotografia de gente eficiente mas sem mais nada, até pode conseguir transformar em potenciais manifestos anti-governamentais velhos cartazes eleitorais do CDS de 1975…

27 julho 2013

«I'M A LOSER»


Uma daquelas raras canções dos Beatles que não se transformou num sucesso de vendas nos míticos anos de início da carreira (1964), talvez por causa da letra, onde se notam uns contornos indefinível e estranhamente adaptáveis à actualidade política portuguesa…

26 julho 2013

O FUNDO DA QUESTÃO

Se, há cerca de três semanas em O Lavador de Janelas me lamentei aqui quanto ele há assuntos em que é preciso esperar anos para que nos possamos aperceber dos seus contornos mesmo mais simples, quero assinalar neste mesmo lugar e com outra fotografia que julgo adequada quanto a publicitação de alguns mails da actual ministra das finanças tornou a questão política dos swaps razoavelmente transparente. A fotografia foi feita no Lago Flathead no Montana por Gretchen Bredeson para a National Geographic.

25 julho 2013

MOMENTO TELEVISIVO


Já se passou tempo suficiente para atribuir o devido valor histórico ao momento televisivo acima, em que um comentador televisivo brasileiro se dedica a explicar ao seu auditório o que devem pensar das manifestações de protesto que ocorriam por aqueles dias nas ruas das cidades brasileiras. Todavia, além disso, o artista quis promover um inquérito telefónico com uma pergunta capciosa para sustentar sua opinião. Mas a malta começa a sabotar-lhe o script… O infeliz ainda tenta emendar a mão e reescrever a pergunta de forma ainda mais tendenciosa para obter o resultado conforme, mas o povão telefónico reage como o seu homólogo das ruas, sabotando os seus esforços: se antes as respostas não conformes rondavam os 60%, na resposta à versão mais esclarecida da pergunta elas subiram para os 70%. O final é verdadeiramente democrático, com a submissão do professor Marcelo lá do sítio, ainda que relutante, à vontade popular. É um episódio para confirmar nas intenções, mas também desmentir nos resultados, uma passagem da letra do celebrado Brasil de Cazuza (abaixo) quando ele fala de uma TV a cores (…) programada para dizer “sim, sim”…

24 julho 2013

«TAKE FIVE»


Além dos três empossados de hoje, a que há que acrescentar Maria Luís Albuquerque e descontar Álvaro Santos Pereira e Vítor Gaspar, mas ainda contando com a troca de Poiares Maduro e Marques Guedes por Miguel Relvas três meses atrás, no fim perdem-se as contas (de Excel?...) a quantos ministros a mais este governo vai ganhando, depois de um prometido e propagandeado governo de dimensão historicamente pequena

SOBRE A SUJIDADE DA POLÍTICA

Gostaria de enfatizar previamente quanto a escolha de Rui Machete para a pasta dos negócios estrangeiros, cerca de 28 anos depois de ter desempenhado as suas últimas funções como governante, me parece assemelhar-se a uma daquelas escolhas de recurso, em mais um dos processos de remodelação governamental que entre nós conseguem ser sempre interpretados como mais uma manifestação de degenerescência política do executivo.

Posto isto, torna-se perfeitamente inaceitável como, quase em simultâneo com a notícia do nome dos nomeados, aparecem histórias sórdidas sobre o seu passado. Parece confirmar-se a existência por aí de uma data de factos conhecidos de um número restrito de cidadãos, graves de acordo com o que vem redigido pelas notícias, mas que só têm importância levar ao conhecimento público se o implicado se dispuser a ocupar cargos políticos de responsabilidade. E o inverso também é verdadeiro: quem desocupa os cargos sofre de imediato um alívio total nessa pressão, constate-se por exemplo o desinteresse em continuar a avaliar os resultados da política financeira prosseguida por Vítor Gaspar depois de ele se ter demitido.

O resultado é aquilo que parece ser uma chantagem permanente sobre quem se disponha a desempenhar cargos públicos e, se não é difícil adivinhar o interesse dos rivais políticos por detrás de todas essas manobras, também é fácil constatar quanto é indispensável a cumplicidade dos agentes da informação para a activação/desactivação destas manobras de ataque ao carácter dos rivais mal eles entram em campo.

Concretamente, neste caso de Rui Machete e das suas associações ao BPN e ao BPP, caso ele esteja  implicado, então há muito tempo que o estará, mas sem que o facto - com muitos outros nomes de implicados - tenha sido realçado devidamente pela comunicação social como lhe competiria. A verdade é que a política que existe não poderia parecer a porcaria que é sem o jornalismo de porcaria que cultivamos.
A fotografia foi retirada daqui.

O CASACÃO DO GODO

Há mais de quarenta anos que conhecia este episódio de Astérix Legionário – e até o considerava uma piada pouco conseguida… – mas foi só ontem que o encontrei fotografado, provando que pode ser real.

23 julho 2013

DA DIALÉCTICA DOS PARTOS REAIS

Depois de uma jornada consecutiva de mais de catorze horas de trabalho, mesmo sendo (ou sobretudo por ser…) de parto, será que a duquesa de Cambridge também merece tornar-se numa filha adoptiva honorária da classe operária?…

TV NOSTALGIA – 73


O problema da falta de graça desta série dos desenhos animados com as desventuras de Dick Dastardly é que, depois do episódio inicial, rapidamente se perdeu de vista o enquadramento da história: uma esquadrilha de aviadores alemães que, durante a Primeira Guerra Mundial, tentavam interceptar um pombo-correio americano. Em vez disso, as histórias seguintes dispersaram-se para a inventividade cada vez mais disparatada das máquinas voadoras que perseguiam o pombo e para os caracteres estereotipados dos protagonistas, a ponto de se perder o senso na falta de senso, quando se acabava por fazer um cão voar apenas por dar ao rabo…

Metaforicamente, a série pode passar pela nossa história política recente, depois da assinatura do resgate há dois anos atrás. Temos andado tão absorvidos pelos contínuos enredos do quotidiano, aparentemente em perseguição do pombo (a redução do deficit público), que só às vezes nos apercebemos que, não só o pombo se safa sempre (os objectivos do deficit nunca são alcançados), como que progressivamente ele vai voando cada vez mais alto já tendo atingido os 127,2% do PIB. Muttley, o tal cão que, com os seus resmungos e risos sacanas, acaba por nunca se espalhar no chão por dar inverosimilmente ao rabo, só pode ser evidentemente Vítor Gaspar…

22 julho 2013

PAULO PORTAS, HIMSELF

Agora que parece que o teremos irrevogavelmente de regresso como vice-primeiro-ministro, creio que vale a pena ouvir esta entrevista com Paulo Portas há uns vinte anos atrás, ainda com umas modulações abichanadas no discurso, a fazerem lembrar as (influências?) de Miguel Esteves Cardoso. Mas com algumas declarações bem interessantes, a começar pelo probably inicial a provocar o trocadilho do título que escolhi, um interesse que apenas aumenta quando confrontamos essas declarações com aquilo que hoje sabemos que o futuro lhe reservava a ele e a alguns daqueles que comenta. Paulo Portas já foi aquilo que ali se descreve mas também já o vimos a ser muitas outras coisas, não é em vão que o ouvimos confessar como gosta do lado táctico da política ao mesmo tempo que se apressa a acrescentar que gosta do lado essencial da política. O que ele não diz, mas acrescento eu, fundado na observação de todos estes anos é que, quando os dois lados se antagonizam, ele prefere sempre o primeiro lado...

Mas a verdade é que a história deste nosso regime não se virá a fazer das convicções essenciais dos seus protagonistas, antes dos seus tacticismos. E aí, como alguém me observou recentemente, Paulo Portas, como um dos mais habilidosos manipuladores da comunicação social, poderá ser o sonho daqueles que se dispuserem a escrever futuramente a sua biografia lá para meados do Século XXI, uma biografia que será certamente recheada. Actualmente com 51 anos, Portas já tem um passado de notoriedade que é quase metade disso em duração, desde os seus tempos do jornal Independente e, previsivelmente, ainda terá outro tanto para o futuro: apesar do ridículo, haverá um certo consenso que este episódio da recente demissão irrevogável arrisca-se a ser apenas mais uma nota pitoresca numa biografia política já agora recheada de várias notas necrológicas à Mark Twain… Mas haverá quem consiga antecipar o que é que ele poderá dizer numa entrevista daqui por 25 anos?... 

TV NOSTALGIA – 72


Mr. Deeds vem para a cidade foi uma série televisiva que a RTP passou em 1971/2. O enredo, recuperado de um filme homónimo de 1936 de Frank Capra com Gary Cooper, é sobre um simplório da província com aspecto de pessoa simpática (o actor Monte Markham) que, herdando uma fortuna colossal, tem de se metamorfosear num gestor e das aventuras e desventuras desse processo. O genérico (acima) agradava-me particularmente pelos contrastes, embora me intrigasse a questão sobre o que levara aquela esplendorosa limousine a empanar em pleno cruzamento. Embora gostasse dela, a série veio a não ter grande sucesso: foram tempos em que as histórias de provincianos que vinham triunfar para a cidade já e ainda não estavam na moda…

AS IRMÃS ANDREWS

Mais do que a imagem (que se começava a impor nos anos em que elas surgiram) as Irmãs Andrews são um som inconfundível. É o som harmonizado das três, LaVerne, Maxene e Patty, respectivamente como contralto, soprano e mezzo-soprano, que cantam no vídeo abaixo um dos seus inúmeros sucessos da década de 40, logo nos seus princípios, quando o Mundo já entrara na Segunda Guerra Mundial mas os Estados Unidos (e a União Soviética…) ainda não. A canção intitula-se Down by the Ohio e a letra conta-nos a história do charme irresistivelmente rústico de um jovem camponês daquele estado que, com as suas galinhas e as suas couves e para qualquer das irmãs, destrona as possibilidades de quaisquer pinga amores tradicionais em as conquistar. Pode parecer bizarro mas há que aceitar que é mesmo assim, como quando se parte de Boliqueime para chegar a Belém...

21 julho 2013

O NOSSO ABRARACOURCIX

Não pretendo antecipar o conteúdo da comunicação desta noite de Cavaco Silva quando insiro a cena acima. O presidente poderá não rebentar por ter sido mal compreendido como ali acontece com Abraracourcix, mas a pose superior e distante a que temos assistido nas suas últimas intervenções públicas, assemelham-se demasiado no despropósito às tradicionais poses majestáticas do caricato chefe gaulês para não apetecer relembrar-lhe quanto Cavaco Silva está desrespeitadamente imerso na bagunça da actual política portuguesa.

20 julho 2013

COMO FAZER UMA AGULHA ATRAVESSAR UM BALÃO INSUFLADO

Esta história, como a famosa citação bíblica, envolve agulhas e ricos mas num contexto complementar. Um dos truques mais engraçado que conheço é o de fazer uma agulha atravessar um balão insuflado como se vê acima. Claro que há um truque (que não vou revelar…) para que o balão não expluda como se estaria à espera. Nem de propósito, descobri que há uma habilidade semelhante (essa revelarei…), quando se fala dos ordenados dos gestores das grandes empresas. Como se observa no quadro abaixo, originalmente publicado no Expresso vai para três anos, às remunerações milionárias de Zeinal Bava, Paulo Azevedo, António Mexia ou Ricardo Salgado tive apenas que adicionar uma coluna com a remuneração de Jorge Jesus, que não apenas as supera, como também moderará as tradicionais explosões de indignação para com os capitalistas e banqueiros exploradores do povo. A esquerda não democrática há muito que se deixou do discurso do futebol como ópio do povo e, mesmo que não se queira reconhecer que Jesus é um explorador dos trabalhadores, seria um absurdo classificá-lo na categoria de proletário da bola
O irónico é que, mesmo que os partidos da tal esquerda repleta de princípios não queiram oportunisticamente beliscar Jorge Jesus pelas razões mais populistas possíveis, os ordenados de todos eles são obscenamente elevados…

19 julho 2013

...PARA A FOTOGRAFIA

Voltando ao ciclismo como tema de Verão, permitamo-nos recordar como a modalidade tinha que viver no interesse popular da rivalidade assanhada entre dois ases do pedal. Entre as mais nostalgicamente interessantes que recordo, há a entre os franceses Anquetil e Poulidor além-fronteiras e a entre Joaquim Agostinho do Sporting e Fernando Mendes do Benfica cá por casa. Mas a fotografada acima é mais longínqua, reúne os italianos Gino Bartali (à esquerda) e Fausto Coppi em pleno duelo esforçado numa etapa de montanha da Volta à Franca de 1952. A estrada ainda não é asfaltada, os carros que acompanham os ciclistas são jipes, é nítida a ausência dos adeptos à beira da estrada como hoje os vemos a incentivar os ciclistas. No fim daquele esforço, seria Coppi a vencer a etapa de 266 km, passando a envergar a camisola amarela. 
 
Porém, o que distingue a fotografia é o instantâneo de solidariedade entre os rivais, entregues a si próprios para se reabastecerem e que trocam o que parece ser uma garrafa de água. O gesto é simples e poderá ter sido puro mas apenas se manteve assim até à fotografia se ter tornado conhecida e a polémica se ter desencadeado entre os dois clãs sobre quem estaria a dar a garrafa a quem. A fotografia não é explícita, ambos teimavam ser eles os dadores, um deles mentia e sessenta anos depois ainda se escrevem artigos no jornal pretendendo encerrar a polémica. Mas, mais do que apenas sobre ciclismo, a fotografia é também uma boa metáfora sobre o momento político actual e as negociações a decorrer entre os partidos, em que suspeito que o mais importante para eles será, mais do que a atitude, a forma como eles forem apanhados na fotografia…

18 julho 2013

PARA VARIAR...

O que me parece ter distinguido o tradicional ritual desculpabilizador dos maus resultados alcançados nos exames nacionais que costuma enfeitar esta época do ano, foi a reacção do ministro Nuno Crato, atribuindo a responsabilidade dos resultados a factores estruturais e não circunstanciais. É capaz de ter razão...

SOBRE O SIGNIFICADO POLÍTICO DE CERTAS CORES

Este cartaz acima com o símbolo dos Verdes alemães (fundados em 1980) serve para nos recordar que, ao contrário do que acontece em Portugal, não é em todos os países que na paleta das cores políticas o verde se tornou na cor da dissimulação e da falsificação, como um equivalente político ao amarelo nos sindicatos. Não deixa de ser uma ironia que sejam os comunistas, os vermelhos, aqueles que recorrentemente pintam de amarelo o sindicalismo que não controlam, os mesmos que rodeiam o seu partido de uma multidão de organizações disciplinadamente verdes por se fingirem passar pela cor não genuína. Elas pululam por aí: só para dar um exemplo que seja retirado das notícias de hoje, a Associação Nacional de Sargentos é mais uma dessas organizações verdes.

17 julho 2013

A (OUTRA) INCOMPETÊNCIA INQUALIFICÁVEL

O erro assinalado no poste acima (clicar em cima da imagem para a ampliar: o verbo tratar conjugado reflexivamente no presente do indicativo é confundido com o pretérito imperfeito do conjuntivo) não passaria de mais uma gralha que displicentemente se deixaria passar numa leitura recreativa de blogues não fora o encadeado de pessoas de alto coturno responsáveis por ele ter ido ali parar. O fenómeno começa pelo autor da prosa, o afamado professor Santana Castilho, consultor do Banco Mundial, da União Europeia e da UNESCO entre outros predicados proclamados no Público, jornal que nos brindou com a crónica de onde a passagem acima foi retirada, mas a responsabilidade transita posteriormente para o ele mais fraco desta cadeia de incompetência inqualificável, nas pessoas dos revisores e editores desse jornal, que terão mantido o erro, quiçá por não terem lido a crónica, fiados na erudição de tão ilustre cronista mas acaba por se depositar finalmente naquele que, de tanto a apreciar (à crónica), a quis transcrever para o seu próprio blogue, Eduardo Pitta, um nome que as letras portuguesas tão bem conhecem: poeta, escritor, ensaísta, colunista e crítico literário. Perante a sofisticação dos intervenientes neste clamoroso erro, envolvendo professores, jornalistas e escritores, gente de letras, chega a dar pena que a gramática tenha regras tão pouco flexíveis… Olha se houvesse punições, como parece pedir o autor da crónica...

VOCÊ PRECISA É DE TOMAR BANHO…

Tempo de Verão foi sempre tradicionalmente época de apogeu do ciclismo, acicatado pela comunicação social que assim colmatava aqueles meses de ausência de futebol. O vídeo abaixo é a cobertura noticiosa da 5ª etapa da Volta a Portugal em 1959 feita pela então quase recém-nascida RTP (acima). Mais interessante do que o nome do vencedor, o ciclista Azevedo Maia do Futebol Clube do Porto, ou das vicissitudes da etapa que se disputou na tarde de 4 de Agosto entre Portimão e Tavira (113 km), nota-se no entrevistado os jeitos de uma sociedade que era então ainda rústica, mas onde de há muito desapareceu essa humildade, em contraste com o entrevistador, fazendo as perguntas e dando as respostas, mostrando já os tiques de condescendência que ainda hoje podemos encontrar com frequência quando as vedetas da TV entrevistam o povo. Que a entrevista termine com uma recomendação dita de uma maneira tão imperativa que poderia passar por equívoca, como se o entrevistado estivesse a cheirar tão mal que precisasse de tomar banho de imediato, é apenas a ironia final de uma entrevista em que nem entrevistado nem entrevistador têm jeito para aquilo…